mercredi 21 mars 2007

Chloé por Duke Elligton

Chloé se levantou para buscar mais gelo. A festa estava lotada e eu a observava de longe. Hoje, ela estava sozinha, encontrou com uns amigos mas preferiu ficar distante e se balançar sutilmente apoiada na parede sem dar muita bola pra quem estava a sua volta. Nunca tínhamos nos falado, apesar de frequentarmos os mesmos lugares. Sou do tipo sonhador, que fantasia com as mulheres. Ainda mais com Chloé, representação maáxima e carnal da mulher com que sempre sonhei. A começar pelo nome. A primeira cachorrinha de mamãe chamava-se Chloé. Assim aprendi a gostar desse nome. Se não tivesse nascido homem, me chamaria Chloé ao invés de Boris. Cresci acompanhando mamãe a toda parte. Era muito divertido. Estréias de filmes, peças, lançamento de livros. As vezes festas noturnas e loucas. Ficava calado observando minha mãe e seus amigos. Mamãe era um pouco instavel. Abandonou o grande amor de sua vida pra se casar com meu pai, que faleceu logo depois que eu nasci. Cresci distante da figura paterna diaria. O grande amor de mamãe, embora tenha sofrido com a separação, sempre voltava. É um cara legal, que a ama muito. Acho que eles ainda terminarão juntos. Desde que comecei a Universidade, levo uma vida mais independente. As vezes saímos pra conversar,eu e mamãe, para falar um pouco da vida.
A primeira vez que vi Chloé foi na miscelânia da Cinelândia. Ela estava fantasiada de colombina, vestia uma saia de filó e um top que deixava suas curvas a mostra. Ela era perfeita, violão, gostosa e sutil. Não tirei os olhos dela durante toda a noite. Ela sempre desviava o olhar. Durante todo o carnaval e em todos o blocos eu a vi. Foi durante esse carnaval também, acho, que ela começou a sair com o Vianinha, meu professor de literatura e uns vinte e cinco anos mais velho que ela. Depois dos blocos, encontrava-os no CCBB, no Cinema Estação e em festas de amigos comuns. Nunca falei muito com Vianinha. Ele era excelente professor, mas eu não concordava com suas idéias politicas. Um dia, ela veio à aula, sentou-se na última cadeira e, quando a aula terminou, ele a chamou_ Chloé. Estava pegando as minhas coisas e senti um frio na barriga_ Chloé. Sai dali com o nome latejando na cabeça. Ela com sua boca vermelha e seu jeito de diva, a colombina mais bonita da cinelândia se chamava Chloé.
Era para eu estar acompanhado, mas a maluquinha bebeu tanto na noite anterior que preferiu ficar em casa. Começamos a sair juntos há uma semana, ela é legal, bonitinha, inteligente, mas maluquinha demais. Isso as vezes me irrita, quando ela bebe fica vulgar. Na segunda noite que saimos juntos, escapei por pouco de um soco na cara ao tentar defende-la de um bebado que pensou que ela tava dando mole pra ele. Ela não era a mulher ideal pra mim mas a cinco dias transo como um coelho, me apeguei a ela.
Somos dois comprometidos e solitários esta noite. Ela está triste, quer se perder e veio pra se divertir, mas não está conseguindo. Estava na terceira dose de teachers e precisava de mais gelo. Passei por ela que segurava um copo transbordando de gelo, para ir a cozinha. No congelador, só tinha cerveja. Chloé tinha levado todo o gelo. Bom, além de poeta sou vaidoso e decidi não beber mais cerveja por causa da barriga. Iria continuar no uisque vagabundo.
_ Posso pegar uns gelos? Agora o oásis de gelo é você!
_ Hum.
Chloé, não tinha ouvido a minha cantada ridicula, sorte, eu realmente exagerei.
_ Hum, que voce quer?
_ Só umas pedrinhas de gelo.
_ Ah, tá.
_ Você tá segurando os últimos. Acabou. Na geladeira não tem mais.
_ Que bom então que consegui pegar os últimos. Acho que te conheço.
_ Eu? Não sei, não lembro de você.
_ Você é aluno do Vianinha?
_ Sou, você tambem estuda na ECA?
_ Não, eu tô no Fundão. Mas as vezes assisto umas aulas dele. Ele é maravilhoso.
_ É, ele é um bom professor, mas não gosto da postura politica dele.
_ Bom, eu não entendo nada de politica, não sei....
_ Você ainda é novinha. Mais tarde você vai entender.
_Será?
_Quantos anos você tem?
_ 21 e você?
Preferi mentir e aumentar a idade. Ao falar com Chloé, percebi que ela era dessas garotas que faziam o genero Lolita e, por isso, curtiam caras mais velhos.
_ 32.
_ E você ainda ta na graduação?
_ É a minha segunda faculdade e como já trabalho...
_ Você faz o que?
_ Faço direção de arte numa revista feminina, Miroir. Você conhece?
_ Claro, adoro essa revista. Ela é tudo que eu sou.
_ Ah é, por que?
_ Ah.....
Chloé se abriu pra mim. Falou duas horas de sua vida, de sua infância, que estava triste porque Vianinha, seu namorado, tinha ido passar o final de semana em Teresopolis com a ex mulher e a filha adolescente.... Ela tinha uma voz tão doce e os olhos brilhavam quando falavam de suas idéias. Ela queria montar uma grande exposição de artes plásticas na cidade. Queria viajar pra França. Aprender arabe. Seu maior sonho era trabalhar numa revista com ilustração porque achava glamouroso.
As pessoas estavam cada vez mais bêbadas. A comida tinha acabado e eu precisava comer pra dar uma cortada no alcool. O negócio é que aqui em Santa Teresa a essa hora tudo está fechado, até a barraquinha de Dona Neusa, onde eu poderia comer umas empadinhas. Seria sujo o que eu iria fazer mas...
_ A minha mãe é a editora e dona da Miroir.
_ Verdade?
_ É.
_ Não acredito. Queria conhecer a tua mãe, ela deve ser fantástica.
_ Eu to com um pouco de fome e aqui não tem mais nada pra comer. Você não toparia ir na minha casa. É aqui perto. A gente come alguma coisa e eu te mostro os primeiros numeros da revista.
_ Tá, vamos. Caramba, falei tanto que nem perguntei o teu nome.
_ Vianinha e o seu?
_ Chloé.
Cheguei em casa com a boca seca e um azedo corroendo meu estômago. Deixei Chloé na sala, olhando os quadros e as revistas e fui preparar algo para comermos. Quando voltei, Chloé estava maravilhada com a casa, os quadros, livros e revistas, fotos do mundo inteiro. Disse que era a casa dos seus sonhos. Comemos e falamos sobre a vida. Eu estava esperando a hora certa. Depois que escovei muito bem os dentes, chamei-a ao escritório de minha mãe. Era um dos lugares da casa que eu mais gostava. Eu sempre vinha aqui pra escutar música. Mamãe tinha uma vitrola daquelas portateis da decada de 50 que comprou em Paris e uma centenas de vinis de blues e rock.
_ É um sonho a tua casa, essa vitrola, meu deus. Tua mãe deve ser que nem uma atriz de filme.
_ Verdade. Mamãe parece uma diva, a Monica Bellucci.
_ Essa vitrola funciona?
_ Funciona muito bem, vou por um disco.
Desde que ouvi pela primeira vez o seu nome, ja sabia qual musica iria colocar pra ela. Chloé estava sentada no divã vermelho e esse era o fundo perfeito. Seus cabelos negros com sua pele branca se destacavam e seus labios levemente rosados e fechados indicavam que ela viajava. Ela viajava na nossa historia, na historia de mamãe e que ela sem saber tambem fazia parte, o seu nome.
_ Chloé! Que legal, nossa não conhecia. Não sabia que existia uma musica com o meu nome.
_ É linda,né? É do grande Duke Ellington. Você quer beber alguma coisa?
_ Você tem uisque?
_ Tenho, você quer?
_ Quero, acho que é o mais apropriado, não? Seria perfeito.
O dia amanhecia, fechei todas as janelas e acendi os abajures. A música estourava as caixas de som e Chloé me olhava fascinada e distante. Essa seria uma aurora de sonhos e luxuria.
_ Com gelo ou sem gelo?

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